domingo, 9 de dezembro de 2012

"Felicidade não é virtude nem prazer, mas simplesmente crescimento. 
 Estamos felizes quando estamos crescendo." 

William Butler Yeats 

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Autonomia e liberdade


O significado etimológico de autonomia (de auto, que significa "por si mesmo", e nomos, que quer dizer "lei ou norma") nos liga ao desafio de sermos livres.

Segundo Bucay (2011), autônoma é a pessoa capaz de administrar, sistematizar e decidir suas próprias normas, regras e seus costumes.
É óbvio que, ao fazer isso, a pessoa autônoma não ignora as leis. Trata-se mais de questioná-las, revisá-las e adaptá-las ao seu modo de ser do que simplesmente desprezá-las.

O exercício da autonomia conduz a uma ressignificação (atribuir novo significado) ou mesmo substituição dos valores aprendidos desde a tenra infância. Isso conduz à própria liberdade.

Ainda segundo Bucay, durante anos os pacientes da velha psicanálise de meio século atrás culpavam as ordens, permissões e proibições dos pais e o condicionamento social e cultural recebido na infância a fim de evitar assumir a responsabilidade por suas próprias histórias. Acredito que, ainda hoje, os sujeitos em análise devem evitar perpetuar esse determinismo, uma vez que pode ser mais cômodo culpar terceiros do que arregaçar as mangas e assumir a responsabilidade pelo próprio destino. Reconhecer nossas dificuldades vivenciadas na infância é um primeiro passo (e muito importante!) para o crescimento, mas é preciso ir além. É preciso cuidar delas a fim de não deixar que nos paralisem.

Claro que as feridas da infância podem causar dificuldades ao longo da vida da pessoa. No entanto, o adulto que existe em nós é o único responsável por cuidar das necessidades dessa criança machucada. Existe uma escolha aí: deixar que essas feridas nos consumam até perdermos o rumo ou assumir a responsabilidade por nosso próprio bem estar e buscar ajuda, quando necessário.

Essa é a tarefa do adulto.

Assumir isso é ser adulto.

"Saber que sou livre me obriga a reconhecer que sou eu quem escolhe o que faço, o que digo, o que calo e o que evito. E essa decisão me torna responsável por tudo isso e por suas consequências.
Sou eu quem decide e por isso são meus os sucessos e acertos, assim como os fracassos e erros."
Jorge Bucay

"Cada pessoa é seu ditador absoluto, seu provedor particular de glórias ou catástrofes; o governante da própria vida, sua recompensa, sua punição".
 Mabel Collens

sábado, 21 de julho de 2012

Perus ou águias?

 
"Certa tarde, um camponês encontrou, no fundo do seu quintal, um ovo muito grande e cheio de pintas. Nunca tinha visto nada parecido.
      Surpreso e curioso, decidiu levá-lo para casa.
      - Será que é um ovo de ema? - perguntou sua esposa.
      - Não tem a mesma forma - disse o avô. - É grande demais.
      - Podemos comê-lo! - propôs o filho.
      - Talvez seja venenoso - refletiu o camponês. - Antes deveríamos saber que tipo de ave bota um ovo desses.
      - Por que não o deixamos no ninho da perua que está chocando? - sugeriu a filha caçula. - Assim, quando nascer, veremos o que é...
      Todos concordaram e assim foi feito. Mas logo se esqueceram do pobre ovo.
      Duas ou três semanas depois, a casca se quebrou e surgiu uma ave escura, grande, nervosa, que, com muita avidez, comeu tudo o que encontrou pela frente.
      Quando a comida disponível acabou, o estranho pássaro olhou para a mãe com vivacidade e disse, entusiasmado:
      - Não vamos sair para caçar?
      - Como assim, caçar? - perguntou a mãe um pouco assustada.
      - Como? - frisou o filhote. - Voando, é claro. Vamos voar!
      A mamãe perua se surpreendeu muito com a proposta do filhote e, munida de amorosa paciência, explicou:
      - Olhe, filho, os perus não voam. Você só tem essas idéias porque é guloso. Faz mal comer rápido e em excesso.
      Dali em diante, a família de aves, avisada pela mãe dos loucos caprichos daquele filhote, passou a lhe oferecer alimentos mais leves, sempre o incentivando a comer pouco e devagar.
      No entanto, mal ele terminava sua refeição, irremediavelmente começava a gritar:
      - Agora, pessoal, vamos voar um pouco!
      Todas as aves do cercado voltavam a explicar:
      - Você não entende que os perus não voam? Mastigue bem, coma menos e esqueça essas loucuras, pois um dia lhe trarão problemas.
      O tempo passou e, à medida que crescia, o filhote falava cada vez mais da fome que sentia e menos da vontade de voar.
      Ele cresceu e morreu junto com outros perus do cercado e terminou como todos: assado na mesa do camponês, numa ceia de Natal.
      No entanto, ninguém gostou da sua carne, que era dura e não tinha sabor de peru.
      Também, pudera! Não era um peru, mas uma águia capaz de voar a 3 mil metros de altura e de levantar uma ovelha pequena entre suas patas...
      No entanto, morreu sem saber disso, pois nunca teve coragem de abrir as asas... E porque ninguém nunca lhe disse que tinha alma de águia!

(Fonte: livro "Quando me conheci" de Jorge Bucay.)

Algumas pessoas levam a vida assim, como perus, sem saber que são águias!
 
No seio familiar de cada pessoa existem normas de convívio e um cultivo de valores muito específicos, que são construídos a partir das vivências dos pais e repassada aos filhos por meio da educação proporcionada a eles.

Às vezes, esses valores chocam com nossa essência (veja o caso da águia!) e acabam por nos limitar, não proporcionando uma forma mais plena de viver.

O que muitas vezes acontece é que não nos damos conta de quais desses valores herdados da família podem ser destrutivos e/ou limitantes para nós, pois nem sequer os reconhecemos! Ou se os reconhecemos, nunca nos permitimos questioná-los.

O autoconhecimento nos possibilita conhecer nossas potencialidades, bem como nossas reais limitações, assim como o reconhecimento de que somos serem únicos e que, podemos sim, escolher o que acreditamos ser melhor para nós, que não precisamos perpetuar o legado cultural da nossa família. Enfim, não precisamos viver segundo normas sociais que não são apropriadas para nós.

A psicoterapia nos proporciona o encontro com nossa essência e, a partir daí, a construção de parâmetros e modos de existência mais plenos, mais apropriados à nós e à nossa realização como pessoas.


sábado, 9 de junho de 2012

A dádiva de ser terapeuta


A relação entre paciente (ou, como se costuma dizer nas abordagens humanistas, “cliente”) e terapeuta é um tipo de relação com características muito peculiares. Embora tal relação se estabeleça por fins comerciais (no sentido em que o cliente procura o terapeuta solicitando um serviço e paga por ele), a dimensão dessa relação assume uma profundidade tal que dificilmente encontramos algo parecido em nossas relações cotidianas.

À medida em que o cliente sente-se à vontade na presença do terapeuta, sua confiança nele vai se solidificando, sessão a sessão, e assim o cliente se aprofunda mais e mais em suas questões. O terapeuta essencialmente ético sabe da responsabilidade de testemunhar as questões mais delicadas que seu cliente traz, sejam elas seus maiores medos, sonhos, desejos ou angústias.

Conhecer o mais íntimo de uma pessoa é uma enorme dádiva! Sempre me sinto incrivelmente honrada, não só pela confiança depositada em mim, mas também porque me é revelada muita beleza na essência humana, mesmo nos discursos tristes e nas dores sofridas da vida. E à medida em que acolho o discurso repleto de emoções que meu cliente traz para a terapia, necessariamente me sinto enriquecida.

Talvez isso aconteça pelo fato de que as pessoas que procuram psicoterapia quase sempre querem ser pessoas melhores. Normalmente querem se conhecer, querem entender o que estão fazendo de errado, uma vez que sentem que se algo não está muito certo em suas vidas, algo de errado estão fazendo. O que acontece com frequencia é que o “algo errado” que estão fazendo é terem se alienado de si mesmas, não percebendo suas totalidades, não respeitando os próprios limites.

À medida em que o cliente se revela para o terapeuta e é acolhido por este, a aliança terapeutica se estabelece. O cliente sente-se aceito do jeito que é, sua autoestima se fortalece e ele se sente com mais coragem para encarar suas dificuldades e trabalhar mais a fundo suas questões.

E isso é só o começo...



Obs: Este post é dedicado aos meus queridos clientes, que, revelando-me suas essências, enriquecem tanto a minha existência.

quinta-feira, 7 de junho de 2012



"Aqueles que conservam a sua paz interior em meio ao tumulto da vida moderna estão imunizados contra as doenças nervosas".

                                                                  Alexis Carrel


domingo, 13 de maio de 2012


Declaração da atriz norte-americana Sandra Bullock sobre seu filho Louis Bardo adotado por ela em 2010:  

“É bem simples o meu sonho para meu filho: que ele veja que as tristezas da vida não eliminam as grandes alegrias”.

Muito sábias palavras! O sonho dela não é que o filho seja muito bem sucedido, ganhe muito dinheiro ou que seja famoso (embora ela deva desejar ótimas coisas para o filho). Seu sonho é que ele veja o lado belo da vida e seja feliz!

Às vezes, nós, mães desejamos tanta coisa para os nossos filhos... isso quando já não temos um futuro (de sucesso, claro) traçado pra eles! E esquecemos de que o maior presente que podemos dar a eles é deixar serem quem são. Educar, ensinar, orientar, com certeza, mas deixarem ser quem são. Por mais que seja difícil, permitir que eles aprendam com os próprios erros, que cresçam com as próprias escolhas e, ainda assim, oferecer colo quando precisarem. Tudo sem cobrar nada em troca (além do respeito aos outros e a si mesmo, em amplo sentido), entendendo que essa é a ordem natural da vida: cada geração se encarrega da geração seguinte.


Feliz dia das mães!!


quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Pais e filhos nas redes sociais

Antes da internet, lugares como praças, lanchonetes e shoppings eram ambientes eleitos pelos adolescentes como “hábitat natural”. Era nesses locais que os jovens se reuniam para conversar, interagir e socializar. Graças às redes sociais, o encontro cara a cara ganhou uma versão virtual — mas com uma pequena diferença: agora, os pais podem participar das rodas de conversa. Um recente levantamento feito por pesquisadores de mercado da empresa Lab 42 nos Estados Unidos descobriu que os pais já fazem parte da vida virtual dos filhos. Dos 500 entrevistados, 92% são “amigos” dos filhos no Facebook. E eles não se acanham em apontar o motivo para a inserção digital: garantir que as crias estão seguras na internet foi o que levou 40% deles a criar um perfil no site, enquanto 15% afirmaram ter curiosidade sobre os assuntos que os filhos conversam na rede.



Utopia
Os tempos podem até ter ficado mais modernos e tecnológicos, mas os adolescentes ainda seguem o mote “tudo o que é proibido é mais gostoso”. De acordo com dados da Parent-Teen — Internet Safety Report 2011, pesquisa feita pela GFI Software, 34% dos 535 adolescentes entrevistados afirmaram ter perfis paralelos ao “oficial” para publicar coisas que não querem que os pais saibam. Quase 24% deles admitiram visitar sites direcionados para adultos — e 53% confirmaram ter mentido sobre a própria idade para poder entrar em páginas proibidas para menores de 18 anos. E, se não dá para ter liberdade em casa, dá-se um jeito: 72% dos adolescentes usam os computadores da escola para visitar sites proibidos pelos pais. Isso sem contar os celulares com internet, usados por 79% dos entrevistados como alternativa ao computador de casa.

Por essas e outras, Luciana Ruffo, psicóloga do Núcleo de Pesquisa de Psicologia em Informática da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), confirma que a ideia de tentar limar o acesso dos adolescentes à rede é utópica. Para proteger os filhos sem ser acusado de invasor de privacidade, usar o bom senso, assim como em muitos outros dilemas da vida, é a solução ideal. “Alguns pais entram na internet para dar palpite no que o filho faz ou diz. Isso limita o adolescente, que vê na internet um espaço para experimentar, ser diferente dos pais”, justifica Luciana. Ela sustenta que outra coisa capaz de tirar os adolescentes do sério são pais que se comportam como se fossem, literalmente, amigos. “O filho tende a não gostar quando o pai quer ser amigo e interagir com os colegas dele, por exemplo, porque pai é pai, não é amigo”, justifica.

Assim como a permissão para sair à rua sem adultos por perto, Luciana diz que o acesso não supervisionado às redes sociais deve ser galgado, conquistado aos poucos pelos adolescentes. “Você não solta seu filho na rua de uma vez. Primeiro, ele vai à padaria acompanhado, depois sozinho”, argumenta. “O pai ensina o filho sobre como falar com estranhos na rua, mas não tem o hábito de ensiná-lo como se comportar na internet.” Para pais que têm a senha dos filhos, a psicóloga recomenda transparência para evitar conflitos. “Sempre que a pessoa for acessar o perfil do filho, deve avisar”, reforça. “Nunca entre e depois diga que acessou. Ninguém gosta de se sentir invadido.”

Mesmo que os adolescentes torçam o nariz para o monitoramento, a presença dos progenitores na rotina virtual dos filhos tem razão de ser.

Mara Farias Vieira, psicóloga clínica, diz que os pais não devem se sentir acanhados em manter contato com os filhos na internet — uma vez que a prática é apenas uma extensão do que os pais sempre fizeram desde sempre, que é cuidar dos próprios filhos. Assim como os pais orientavam com relação à televisão, devem conversar com as crianças ou adolescentes sobre a internet. Não adianta, entretanto, querer “forçar amizade”, como dizem os próprios adolescentes: comentar em todas as fotos ou mensagens que o filho coloca pode ser o estopim para brigas intermináveis. “Os pais devem conversar para que eles se sintam à vontade de procurá-los”, ensina. “Jovens são seres em formação, precisam de quem os oriente.”

Ainda que a preocupação tire o sono, Mara diz que é preciso respeitar a privacidade dos adolescentes. “É como se os pais estivessem nas praças de antigamente, ouvindo a conversa dos jovens.” Ivonete Garcia, psicóloga clínica, hospitalar e neurológica, reforça: sem diálogo, é impossível estabelecer regras. “Se o pai apenas reproduz regras que recebeu, não terá como saber até onde pode ir com relação ao respeito à intimidade do filho”, argumenta. Ivonete frisa que os pais devem manter a postura de educadores — mesmo que, para isso, precisem ser mais diretos que o de costume. “Se a criança é mais agressiva ou tem um temperamento mais forte, os pais têm tendência a não ‘enfrentar’, ficam com medo de ela se sentir incomodada”, completa a psicóloga. “Isso não funciona, porque ele (o pai) tem que saber que está formando o caráter do jovem.”

(Adaptado da matéria publicada no jornal Correio Braziliense em 25/01/2012)

Texto original, aqui.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Somos o que pensamos ser


O psiquiatra canadense Norman Doidge é o autor de "O Cérebro que se transforma", um relato das pesquisas sobre a possibilidade de os estímulos externos mudarem a estrutura e a fisiologia do cérebro, teoria conhecida como neuroplasticidade. Publicado em mais de 100 países, o livro chega às livrarias brasileiras neste mês.

Ele concedeu a seguinte entrevista à revista Veja:

A neuroplasticidade desacredita ou confirma as teorias do neurologista Sigmund Freud?


Freud não foi só o pai da psicanálise. Ele foi um dos primeiros estudiosos a perceber o eixo central da plasticidade cerebral. Em 1886, quando raros cientistas entendiam o cérebro como uma grande rede, ele propôs a Lei da Associação por Simultaneidade. Segundo essa lei, toda vez que alguém percebe duas coisas ao mesmo tempo, como um menino com cabelos vermelhos, os dois conceitos são processados por neurônios de diferentes regiões, que se ligam simultaneamente e fortalecem a conexão entre si. A tecnologia de neuroimagem não apenas lhe deu razão, mas também confirmou a eficácia da psicanálise. A maior parte das psicoterapias altera as estruturas cerebrais da mesma forma que os remédios para distúrbios da mente. Não dá mais para alegar que terapia é só conversa jogada fora.


O senhor diz que somos o que pensamos ser. O que isso significa?


Diversos estudos revelaram que pessoas que praticam um instrumento musical apresentam mudanças no mapeamento cerebral idênticas às das pessoas que apenas imaginam estar tocando tal instrumento. A maioria dos indivíduos, inclusive os cientistas, despreza o poder da imaginação. Há um teatro virtual acontecendo a todo momento dentro da cabeça de cada um de nós. Por parecer real, tudo o que uma pessoa imagina se torna um gatilho para as emoções e ações. Os pensamentos positivos são capazes de ligar os centros de prazer do cérebro da mesma maneira que a presença de uma pessoa querida ou uma taça de vinho. Isso é uma forma de sair, mesmo que momentaneamente, dos estados negativos. Quem imagina eventos ruins aumenta as conexões neurais nos centros da emoção negativa, o que pode levar alguém medroso a se tornar um fóbico patológico.


A interatividade do computador altera o cérebro para o bem ou para o mal?


Desconfio que mais para o mal do que para o bem. Os equipamentos eletrônicos são tão compatíveis com o nosso cérebro, que também é movido a eletricidade, que alteram a nossa atenção, tornando-nos viciados em tecnologia. O vício é um fenômeno plástico e não se aplica só às drogas. Pessoas se tornam viciadas em corrida, em jogo, em compras, em paixões. O homem supõe que controla os dispositivos incríveis que criou. Meu temor é que esteja acontecendo o contrário: todo esse aparato tecnológico é que está nos reprogramando.


Como a plasticidade cerebral pode ser usada pela medicina?


As possibilidades são incontáveis. A plasticidade não afeta só a nossa saúde ou o nosso cotidiano. É o modus operandi do cérebro. Ela nos faz humanos. Somos "Homo neuro-plastica". As descobertas que estão por vir podem levar à abertura da caixa-preta que revela quem somos e de onde viemos.