A constituição de uma família e o tornar-se pai e mãe são fenômenos importantes para o estabelecimento de uma identidade social adulta, o que contribui para a realização pessoal do indivíduo (Dornelles, 2009). Entretanto, é comum na atualidade alguns casais adiarem o projeto parental em busca de uma realização profissional ou de um melhor status socioeconômico. Quando finalmente decidem ter filhos, não é raro que se deparem com um declínio na capacidade reprodutiva da mulher, capacidade esta em potencial somente confirmada com a gestação. Assim, a infertilidade pode ser uma realidade para estes casais, um diagnóstico frequentemente associado a fracasso, impotência, culpa e vergonha (Dornelles, 2009).
A Associação Americana
para Medicina Reprodutiva (ASMR) define como infertilidade a ausência
de gestação após 12 meses de relações sexuais frequentes (duas a
três por semana) sem anticoncepção. A Organização Mundial de
Saúde reconhece a infertilidade como um problema de Saúde
Pública que afeta de 8 a 12% dos casais em todo o mundo e, embora
reconheça que há evidências de que não deva ser
entendida como uma doença clássica, pois nem sempre é acompanhada
dos componentes dor, internação e risco de vida, ainda assim ela
desencadeia diversas alterações psicológicas, sendo entendida como
uma situação ameaçadora e geradora de diferentes conflitos. (Melamed, 2013).
As Técnicas de Reprodução Assistida (TRA) surgem como alternativas
de solução para o problema da infertilidade e as clínicas que oferecem
estes serviços oferecem esperança aos casais em busca da concretização
da parentalidade.
A partir da nossa prática
profissional em um centro de reprodução humana assistida,
observamos que a infertilidade é vivida como um evento traumático
para a maioria dos casais e é experienciada como um dos eventos mais
estressantes de suas vidas. A incapacidade de conceber pelos métodos
naturais gera uma ferida narcísica, suscitando sentimentos dolorosos
e vivências intensas (Dornelles, 2009), podendo causar um estado de
depressão ou outros transtornos emocionais, muito embora devam ser
vistas como reações normais frente a uma situação anormal que é
a infertilidade (Seger, 2011).
Assim, compreendendo a
infertilidade como uma situação potencialmente traumática de vida,
que inclui questões socioculturais e psicológicas importantes, torna-se salutar um acompanhamento psicoterápico do casal em tratamento. O psicólogo pode
contribuir com sua escuta e acolhimento, ajudando o casal a
lidar de forma menos dolorosa com os desdobramentos da infertilidade
e tratamento, facilitando o enfrentamento dos medos, angústias,
fantasmas e mitos. Através da oferta de informação, pode ajudar o casal a
reconhecer suas reais possibilidades frente aos recursos
oferecidos pela medicina.
A psicoterapia no tratamento da infertilidade pode minimizar o estresse provocado pelos tratamentos, potencializando os recursos
internos (capacidades adaptativas) do casal para lidar com o
estresse, dotando esses pacientes de melhor qualidade de vida
possível.
Bibliografia
Dornelles, L. M. N. (2009). Tornar-se Pai e Mãe no Contexto da
Reprodução Assistida. Tese de Doutorado. Universidade Federal
do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, RS.
Melamed, R. M. M. (2013). A psicologia e o psicólogo na reprodução
humana assistida. Em: I Consenso
de Psicologia em Reprodução Assistida. 23-29. São
Paulo/Rio de Janeiro: Livre Expressão Editora. Makuch, M.Y.;
Seger, L.; Melamed, R.M.M. (2011). A saúde e a doença na reprodução
humana assistida. Em: Borges Jr, E.; Farah, L.M.S.; Cortezzi, S.S.
Reprodução humana assistida. São Paulo: Atheneu.